Presidente pede demissão
Após semanas de especulações em torno do seu afastamento, o presidente da Celg, Enio Branco, pediu demissão ao governador Alcides Rodrigues (PP)Após semanas de especulações em torno do seu afastamento, o presidente da Celg, Enio Branco, pediu demissão ao governador Alcides Rodrigues (PP). Ontem pela manhã, carregando carta em que justifica sua saída da companhia, Enio dirigiu-se ao Palácio Pedro Ludovico e informou a decisão ao governador. O gesto foi a concretização de desejo que Enio já sinalizava há algum tempo e aparentemente não surpreendeu a Alcides, que, segundo Enio, tentou convencê-lo a permanecer no cargo. Quase dois anos depois de assumir a presidência levantando a bandeira de que a Celg seria “um modelo de empresa com capital público”, Enio sai com a certeza de “missão cumprida”.
Pela tarde, ainda no exercício do cargo, esteve com o Conselho de Administração da Celg, em reunião em que foram avaliados o orçamento para 2009 e o balanço de 2008. Enio passou a tarde com o presidente do conselho, secretário estadual de Infraestrutura, Sérgio Caiado; o secretário de Planejamento, Oton Nascimento, e o secretário da Fazenda, Jorcelino Braga, também conselheiro e peça-chave nas negociações quem envolvem a empresa. Antes que a reunião terminasse, Braga deixou o local às pressas e não quis falar com a imprensa. Em pauta, de acordo com Caiado, estava o aprimoramento de medidas para deixar a empresa novamente no azul – tentativa, garante Enio, que caminhava bem no início de sua gestão.
O presidente acredita que estava “na direção certa” para resolver a situação crítica da Celg – que, segundo ele, enfrenta problemas de gestão financeira há mais de duas décadas. “Busquei dotar a empresa de governança corporativa e, numa gestão participativa, diminuímos custos. No balanço de 2007, após apenas oito meses de presidência, apuramos diminuição do prejuízo da Celg em mais de R$ 90 milhões, passando de R$ 267 para R$ 176 milhões”, ressalta, na carta.
A impossibilidade de aplicar aumentos nas tarifas em função da inadimplência da estatal, no entanto, foi uma pedra no sapato. “Todas as empresas de energia enfrentam problemas, mas a Celg tem uma agravante. Nenhuma empresa pode abrir mão de R$ 800 milhões”, disse, referindo-se a valor que a companhia deixou de arrecadar desde setembro de 2006, conforme levantamento exposto na carta, devido à ausência de reajuste tarifário. No texto, Enio chama a atenção do governador para outra consequência da inviabilidade de reajuste. “Veja, Vossa Excelência, que, nesse período, a título de ICMS, deixaram de ser recolhidos ao Tesouro do Estado mais de R$ 200 milhões.”AÇÕESOutro fator de descontentamento teria sido a resistência do governo estadual à proposta de vender ações da companhia ao governo federal – negociação em que teria apostado as fichas. Na carta, contudo, ele explica que esforçou-se “ao limite para concretizar ação com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)”, em que a instituição liberaria empréstimo de R$ 1,2 bilhão para sanear dívidas da Celg com o sistema energético brasileiro, de modo que as ações não precisariam ser vendidas. Só para a Eletrobrás, porém, a empresa deve R$ 1 bilhão.Relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE) aponta que, já em 2007, a Celg tinha mais de R$ 2 bilhões em dívidas intrassetoriais. “Desde o início falamos que esta dívida poderia ser coberta com ativo. O empréstimo não seria a solução definitiva, mas tiraríamos a Celg da UTI para colocá-la num quarto onde pudesse ser cuidada.” A sensação de estar de mãos atadas diante do ciclo de endividamento que a companhia enfrenta e impasses quanto às soluções mais eficazes teriam levado Enio a se demitir.O nome do sucessor ainda não foi divulgado. Questionado, Sérgio Caiado falou que essa é uma questão que só o governador pode responder. Enio fica no cargo até que o nome seja anunciado. A partir do anúncio, o conselho tem até oito dias para convocar nova reunião. Negando afastamento conflituoso e evitando destacar decisões do governo que foram de encontro com suas convicções, Enio limitou-se a dizer: “Estou deixando o cargo para que o governador encontre no próximo presidente o perfil desejado para a Celg no momento.”Ligação com DEM e experiência no setor elétricoEnio Andrade chegou a Goiás a convite de André Rocha, ex-presidente da Celg, e José Paulo Loureiro, ex-secretário de Fazenda e Segurança Pública, no governo Marconi Perillo (PSDB). Enio deixou Santa Catarina para ocupar a função de Controller, em dezembro de 2004, na Celg. Sete meses depois assumiu a diretoria de Relação com Investidores da estatal. Na Centrais Elétricas de Santa Catarina (Selesc), ele era diretor Econômico-financeiro e de Relações com Investidores.O ex-presidente da Celg também foi deputado federal, eleito em 1982, pelo PDS, já extinto – eleição meteórica e junto com a avalanche de protesto pelo País. Em seguida se transferiu ao recém-fundado PFL (hoje Democratas). No Congresso, era ligado ao senador Jorge Bornhausen (DEM). Também foi secretário de Estado em vários governos catarinenses, mas nunca gostou de ter seu currículo ligado à política. Sempre preferiu aparecer como técnico.Em Santa Catarina, durante nove anos, foi diretor Econômico-financeiro e de Relações com Investidores da Telesc (companhia telefônica estatal). Ocupou cargos semelhantes, por quatro anos, na Celesc. Foi então que conheceu a Celg. Enio conseguiu socorrer a estatal catarinense e tirá-la do buraco. Com isso, recebeu convites para trabalhar em diversas companhias de energia elétrica pelo País.Optou por Goiás e ficou 1.056 dias no cargo. No período, faz questão de frisar que cumpriu sua missão e lutou, ao lado do secretário da Fazenda, Jorcelino Braga, e do governador Alcides Rodrigues pela recuperação e capitalização da Celg.Enio é formado em Direito, com especialização em Direito Internacional Público, Marketing Financeiro e Ciências Políticas. Estudou um ano na França (1976). Em 1990, assumiu a diretoria Econômico-financeira da Telesc. Foi deputado federal pelo PFL e secretário de Governo e Comunicação em Santa Catarina (1990-1994). Entre 1999 e 2002, ocupou diretorias na Celesc (Centrais Elétricas de SC). Chegou à Celg em dezembro de 2004, como Controller. Em julho de 2005 assumiu a diretoria de Relações com Investidores da companhia. Em 2007, tornou-se presidente da Celg. Ex-presidente viverá em Goiânia e será consultor da companhiaMesmo após pedido de demissão, o presidente da Celg, Enio Branco, diz que ainda estará próximo da empresa. Ao lado de Sérgio Caiado, presidente do Conselho de Administração da estatal, Enio afirma que pode manter-se como uma espécie de consultor da companhia, esforçando-se para enfatizar o clima amistoso com que deixa a empresa. “O governador não queria que eu saísse, foi uma decisão particular.”Catarinense, garante que continua em Goiânia com a família. “Deixo a Celg, mas não deixo Goiás. Tudo na vida tem um ciclo, cumpri o meu na empresa. Mesmo que venha a exercer atividade profissional em outro Estado, continuo residindo aqui. Sou cidadão goiano e goianiense”, lembrou, referindo-se aos títulos concedidos pelos Legislativos Municipal e Estadual. Cogita-se que Enio volte para Santa Catarina, por ter recebido propostas para presidir empresas privadas. Íntegra do pedido de demissãoExmo. Sr.Dr. Alcides Rodrigues FilhoGovernador do Estado de GoiásSenhor Governador,Em 8 de maio de 2007, atendendo honroso convite de V. Exa., assumi a Presidência das Empresas Celg Distribuição e Celg Geração & Transmissão. Nesse período e ainda durante o processo de Desverticalização do Setor Elétrico Brasileiro, o acionista controlador, Estado de Goiás, criou a Holding Goiaspar (atualmente Celgpar) e a terceira empresa vinculada, a CelgTelecom e Soluções, confiando-me também a direção de ambas.Procurei em todos os momentos comandar o Sistema Celg com responsabilidade, dedicação e comprometimento com os maiores propósitos do Governo de V. Exa., notadamente, aqueles voltados à perseguição constante e inarredável do reequilíbrio econômico-financeiro da Celg Distribuição S/A, Companhia com 53 anos de existência e enfrentando problemas de gestão financeira há mais de duas décadas.Juntamente com diretores, chefias e empregados, esforcei-me ao limite para concretizar a operação com o BNDES, recebendo de V.Exa. e do secretário da Fazenda, Jorcelino Braga, apoio incondicional para o atingimento de nossos objetivos, cumprindo com transparência e retidão todas as etapas de um processo cuja engenharia financeira, embora complexa, foi muito bem assimilada pelos quadros técnicos da empresa.Busquei dotar as empresas de práticas de Governança Corporativa, tendo recebido adesão total dos colaboradores. Com isso, avançamos sobre os problemas e, numa Gestão Participativa e comprometida com resultados, diminuímos custos.Apuramos, já no Balanço de 2007 (após somente 8 meses de presidência), diminuição do prejuízo da Celg D em mais de R$ 90 milhões, passando de R$ 267 para R$ 176 milhões, melhorando praticamente em todos os indicadores e aproximando mais da empresa de Referência da Aneel.Sem poder aplicar os aumentos tarifários concedidos pelo órgão Regulador, a Celg D deixou de arrecadar desde setembro de 2006, cerca de R$ 800 milhões, o que significou perda de receita de R$ 25 milhões ao mês. Veja V. Exa. que, nesse período, a título de ICMS, deixaram de ser recolhidos ao Tesouro do Estado mais de R$ 200 milhões. Assim, Senhor Governador, cumprindo minha proposta de recuperação da empresa e entendendo que a operação com o BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social deverá ainda cumprir etapas a serem alcançadas mediante negociações em curso com a STN – Secretaria do Tesouro Nacional, vejo-me com a missão cumprida na etapa concernente às tratativas com o BNDES em todas suas instâncias.Contando com a compreensão de V.Exa., a quem agradeço pela confiança e apoio irrestrito nessa desafiadora missão, solicito minha liberação das honrosas presidências da Holding Celgpar e de suas subsidiárias integrais, Celg D, Celg G&T e CelgTelecom e Soluções.Muito embora possa vir a exercer atividade profissional em outro Estado, deverei permanecer aqui residindo, honrando os títulos de Cidadão Goianiense e Goiano que me foram concedidos pelos Legislativos Municipal e Estadual, frutos da generosidade do povo deste Estado, que tão bem acolheu a mim e a minha família.Finalmente, Senhor Governador, desejo registrar que, como cidadão, sinto-me representado no Executivo do meu Estado por um Governador digno e realizador que, certamente, marcará sua passagem pelo Governo, entre outras bandeiras, pela determinação de devolver ao seu povo uma Celg forte, competitiva e saudável econômico e financeiramente.Enio Andrade Branco
Fonte: DM